AMAMENTANDO O BEBÊ PREMATURO: PARTE 2
Bebês prematuros não podem começar a mamar antes de 34 semanas de gestação?
Isto não é verdade. A experiência e as evidências (ver referências no final) da Escandinávia mostram claramente que os bebês podem ir ao seio bem antes da 30ª semana de gestação, inclusive já na 27ª semana. Não só podem ir ao seio e mamar, mas também, podem realmente obter leite da mama a partir de 28 a 30 semanas de gestação, 4 ou mais semanas antes do considerado possível na América do Norte.
Na América do Norte e em outras partes do mundo, acreditamos, porque é verdade, que bebês nascidos com 24 semanas de gestação ou até antes podem ser mantidos vivos e deixar o hospital em forma razoavelmente bem, mas é difícil acreditar que um bebê pode mamar no peito antes de 34 semanas de gestação. Como pode?
Bem, salvar um bebê de 24 semanas de gestação é “alta tecnologia” e acreditamos na “alta tecnologia”. Isso prova que os humanos estão acima dos outros animais, e neonatologistas, oh, eles são seres superiores, não exatamente deuses, um pouco abaixo, no nível dos arcanjos, talvez. Mas a amamentação é “baixa tecnologia”, então “quem se importa?”, “não é interessante” e, portanto, a amamentação é ignorada (embora o leite materno, que por muito tempo foi considerado como inferior, agora está de volta à moda), e o que acreditávamos do bebê prematuro e amamentação há 50 anos, bom, não adianta procurar mais, é tudo igual, não muda. Na verdade, a gente acreditava que o leite materno era “baixa tecnologia”, (afinal, é feito por mulher, então… devo falar mais?).
E aí fomos descobrindo mais: o leite materno da mãe de um bebê prematuro é feito sob medida para as necessidades dele, diferente do leite de uma mãe de um bebê a termo; aprendemos que o leite materno contém todos os tipos de compostos muito importantes que nem suspeitávamos que existissem há apenas alguns anos: por exemplo, a lisozima (uma enzima, não tão nova na verdade, que ataca as bactérias e as mata destruindo sua parede celular), mucinas, células-tronco, lactaderina, fator bífido, membranas de glóbulos de gordura do leite, oligossacarídeos do leite humano e muitos outros. Provavelmente muitos outros ainda não foram descobertos. Assim, o leite materno tornou-se de alta tecnologia e digno de interesse, especialmente por empresas de fórmulas infantis que perceberam o potencial de marketing imediatamente. Mas amamentar? Ainda é “baixa tecnologia” e é considerada, erroneamente, algo desprezível. Afinal, o leite materno na mamadeira é tão bom quanto a amamentação, o bebê está mamando leite do peito. Por que nos preocupar para garantir que o bebê mame ao seio?
Ah, sim, esqueci. Bebês prematuros “precisam” de leite materno “fortificado”, portanto não podemos permitir que as mães amamentem. “Alta tecnologia” vence novamente a “baixa tecnologia”. Mas todos os bebês precisam de leite materno “fortificado”? Mais sobre isso na Parte 3.
De onde vem essa ideia de que um bebê deve estar com pelo menos 34 semanas de gestação antes de poder mamar? Pensa-se que os bebês iniciados na mamadeira antes de 34 semanas terão apneias (parada respiratória) e bradicardias (batimento cardíaco lento) como resultado da alimentação com mamadeira. Todos nós sabemos que amamentar com mamadeira é como amamentar ao seio, só que com um bico mais macio. NÃO. Não, a mamadeira não é como amamentar ao seio, mas parece que acreditamos que é. A conclusão é, portanto, que se bebês com menos de 34 semanas de gestação tem maior risco de apneias e bradicardias mamando na mamadeira, provavelmente também tem maior risco quando mamam do peito. Não é verdade.
Amamentar ao seio não é dar mamadeira e também não é dar leite materno em mamadeira. Ao contrário do que muitos neonatologistas acreditam, a amamentação não consome mais energia do que a mamadeira e não cansa o bebê, nem faz com que ele adormeça no peito por ser “preguiçoso”. Esse é um erro baseado na constatação de que os bebês tendem a adormecer no seio, embora ao sair do seio mostrem que ainda estão com fome. Eles não adormecem porque estão cansados ou porque a amamentação consome muita energia. Eles adormecem porque respondem ao fluxo de leite da mama. Se o fluxo do leite for lento, ele tende a adormecer na mama. E por que o fluxo de leite diminui? Porque, na maioria das UTINs, não ensinamos mães como colocar bebês em boa pega, e não ensinamos o simples e útil “truque” da compressão manual do seio .
É geralmente difundido nos “círculos” de consultores de lactação que os bebês puxam bem (ou não) o leite da mama. Então, por exemplo, “o bebê não está ganhando peso porque não está puxando bem o leite”. Bem, na verdade, bebês não puxam o leite. As mães que oferecem o leite .
A noção de que é o bebê quem “puxa o leite” leva à falsa conclusão de que amamentar é um trabalho árduo e que o bebê tem que gastar muita energia para sugar o leite. Isso ocorre ainda mais para um bebê prematuro que tem “músculos da bochecha pouco desenvolvidos”. Os bebês usam os músculos da bochecha para tirar o leite do peito??? Nenhuma das afirmações anteriores é verdadeira. Os bebês respondem ao fluxo de leite. Se o fluxo de leite for rápido e consistente, o bebê fica acordado e mama. Se o fluxo de leite diminuir, o bebê para de mamar e apenas “mordisca” a mama. O fluxo de leite diminui rapidamente porque na maioria das UTIN as mães não são ensinadas a colocar o bebê em boa pega e não são ensinadas a comprimir os seios.
Vídeo 1. A mãe neste vídeo está usando compressão manual da mama para aumentar o fluxo de leite para o bebê que tem apenas alguns dias de vida.
Portanto, bebês prematuros na América do Norte não podem começar a amamentar até a 34ª semana de gestação, enquanto pelo menos alguns prematuros na Escandinávia podem na 27ª semana. Isso não faz sentido algum. É “óbvio”, também, que a mamada no peito não deve ser “muito longa”, cansando o bebê.
Outra conclusão óbvia, mas incorreta, é que os bebês precisam ser alimentados ou suplementados com mamadeira, pois todos parecem acreditar que a mamadeira é menos cansativa. Só acreditamos nisso porque estamos acostumados com ela. A suplementação pode ser feita no peito com auxiliar de lactação que é a melhor forma, mas também em copo aberto.
Vídeo 2. Usando um auxiliar de lactação para suplementar um bebê. Observe que o bebê adormece quando o fluxo de leite diminui, mas acorda e chupa vigorosamente quando o fluxo do leite, oferecido por ajuda do auxiliar de lactação no peito, aumenta. O bebê não estava cansado e adormeceu; o fluxo do leite foi lento e o bebê dormiu porque o fluxo do leite era lento. Quando o fluxo aumentou, o bebê acordou.
Aqui estão alguns artigos que mostram que os bebês podem começar a mamar ao seio bem antes da 34ª semana. Os comentários abaixo da referência são citações exatas do artigo.
Blaymore JA, Ferguson AE, Morales Y, Liebling JA, Oh W, Vohr BR. Breastfeeding Infants Who Were Extremely Low Birth Weight. Pediatrics 1997;100(6).
Blaymore JA, Ferguson AE, Morales Y, Liebling JA, Oh W, Vohr BR. Lactentes amamentados ao seio de extremo baixo peso ao nascer. Pediatrics 1997; 100 (6) .
“Resultados. Os bebês demonstraram maior saturação de oxigênio e temperatura mais alta durante a amamentação ao seio do que durante a alimentação com mamadeira e foram menos propensos a dessaturar para < 90% de oxigênio durante a amamentação. O ganho de peso médio foi maior nos alimentados com mamadeira do que os amamentados no peito (31g vs 9g).
Conclusões. Amamentar bebês extremo baixo peso ao nascer é desejável do ponto de vista de respostas fisiológicas melhoradas, mas tal prática requer apoio à amamentação e possível suplementação para otimizar o ganho de peso”.
Hedberg Nyqvist K, Ewald U. Infant and maternal factors in the development of breastfeeding behaviour and breastfeeding outcome in preterm infants. Acta Pædiatr 1999;88:1194-203
Hedberg Nyqvist K, Ewald U. Fatores infantis e maternos no desenvolvimento do comportamento da amamentação e resultados da amamentação em bebês prematuros. Acta Pædiatr 1999; 88: 1194-203
“Concluindo, a baixa idade gestacional ao nascimento foi associada ao surgimento precoce de um comportamento de amamentação eficiente e uma alta incidência de amamentação completa.”
Nyqvist KH, Sjödén P-O, Ewald U. The development of preterm infants’ breastfeeding behavior. Early Human Development 1999;55:247-264
Nyqvist KH, Sjödén PO, Ewald U. O desenvolvimento do comportamento de amamentação de bebês prematuros. Early Human Development 1999; 55: 247-264
“Independentemente da idade gestacional, as crianças responderam sugando ao primeiro contato com a mama. Pega eficiente e preensão areolar foram observados em 28 semanas com sucções repetidas de > 10 sucções, e > 30 sucções em 32 semanas. A sucção nutritiva surgiu a partir de 30,6 semanas. Sessenta e sete bebês estavam amamentando ao seio na alta. Cinquenta e sete deles estabeleceram a amamentação completa com uma idade gestacional média de 36,0 semanas (33,4–40,0 semanas). O comportamento de sucção precoce é interpretado como resultado de um aprendizado, potencializado por estímulos contingentes. Portanto, sugerimos que as diretrizes para o início da amamentação em bebês prematuros devem ser baseadas na estabilidade cardiorrespiratória, independentemente da maturidade atual, idade ou peso.”
Nyqvist KH, Early attainment of breastfeeding competence in very preterm infants. Acta Pædiatrica 2008;97:776-781
Nyqvist KH, Atingimento precoce da competência de amamentar ao seio em bebês muito prematuros. Acta Pædiatrica 2008; 97: 776-781
“Bebês muito prematuros têm a capacidade de desenvolvimento precoce da competência motora oral suficiente para o estabelecimento da amamentação completa em uma idade gestacional baixa.”
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Translation: Dra Maria Luisa Silva Quintino (Brazil)