GASTROENTERITE EM BEBÊS AMAMENTADOS AO SEIO
Este artigo discute especificamente a infecção do trato gastrointestinal porque é a doença infantil aguda mais comum e muitos médicos e outros profissionais de saúde insistem em dizer para as mães interromperem a amamentação neste momento. Infelizmente, toda e qualquer infecção aguda do mundo na criança que mama é dada como motivo para parar temporariamente ou para sempre a amamentação. Os princípios mencionados aqui se aplicam a qualquer infecção aguda na infância. Deve-se observar que muitas doenças, que não são gastroenterites, podem causar vômitos e diarreia, por exemplo, pneumonia. Ou, outro exemplo, apendicite. Se os pais tiverem dúvidas se é uma “virose” ou não, o bebê deve ser examinado imediatamente por um médico.
Gastroenterite no bebê amamentado ao seio (vômitos e diarreia devido a infecção)
Por causa de todo um conjunto de fatores imunológicos presentes no leite materno, os bebês amamentados exclusivamente raramente têm gastroenterite (uma infecção do trato intestinal, causada por um vírus como o rotavírus ou, menos comumente, por bactérias ou outros microorganismos). Se o bebê amamentado exclusivamente com leite materno tiver gastroenterite, raramente é grave e quase sempre é leve. O melhor tratamento para a gastroenterite é a continuidade da amamentação. Os fatores imunológicos presentes no leite materno não apenas previnem a gastroenterite, mas também ajudam a curá-la, e uma série de outros fatores presentes no leite materno ajudam a curar o intestino.
Mesmo bebês e crianças pequenas que mamam parcialmente são relativamente imunes à gastroenterite.
Portanto, o primeiro passo no tratamento da gastroenterite é continuar a amamentar com a frequência que o bebê desejar. A amamentação contínua não só ajudará no tratamento da infecção, como também manterá a hidratação do bebê. Se o bebê já come alimentos mas não quer comer enquanto está doente, é normal parar de aceitar outros alimentos temporariamente e continuar apenas com o seio materno. Por outro lado, se ele quiser comer, ele deve comer.
Normalmente, o único tratamento necessário para a grande maioria dos casos de gastroenterite é a amamentação. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, página 10: “A amamentação deve ser sempre continuada.”
Amamentar é mais que leite
Não devemos esquecer do conforto e segurança que o bebê ou criança pequena recebe ao mamar. Isso é particularmente importante quando o bebê está doente e talvez triste. Além disso, um bebê que mama quando está doente dá uma garantia aos pais de que o bebê está bem e eles podem se preocupar menos. Assim, a amamentação acalma e tranquiliza o bebê; o fato do bebê obter conforto com a amamentação tranquiliza e acalma também a mãe.
Mas como tratamos o vômito e a diarreia?
Desde que a hidratação do bebê seja bem mantida com a amamentação, não há necessidade de nenhum outro tratamento.
O único outro tratamento que pode ser necessário, com forte ênfase no “pode”, em casos mais graves (raros em bebês amamentados exclusivamente) é a solução de reidratação oral. Soluções de reidratação oral de qualquer tipo só são necessárias se a amamentação não atender às necessidades do bebê. No entanto, alguns pediatras / médicos de família recomendam soluções especiais “aos primeiros sinais de gastroenterite”, recomendação absurda no bebê ou criança amamentada.
A amamentação sozinha pode não atender às necessidades do bebê, por exemplo, se o suprimento de leite da mãe diminuiu por qualquer motivo. Em situações normais, isso só ocorre quando o bebê já está comendo bastante comida. No entanto, se o bebê desejar mamar com mais frequência, como é natural quando o bebê não se sente bem, o suprimento de leite aumentará para aquela ocasião. Vale a pena dar uma olhada também no artigo sobre diminuição da oferta de leite de início tardio.
Em raras situações, a perda de líquidos no bebê / criança é tão rápida ou abundante que ele fica letárgico e não mama. Fluidos de desidratação oral podem ser tentados, mas muitas vezes o bebê também não os aceita. Se for esse o caso, os pais devem procurar atendimento médico imediato.
As soluções de reidratação oral foram desenvolvidas para países com poucos recursos, onde o alto custo da reidratação intravenosa e a necessidade de hospitalização para administrá-la representam um grande fardo para os recursos de saúde. Além disso, em lugares com poucos recursos, o estado de hidratação e o bem-estar geral do bebê são difíceis de monitorar pois há poucos profissionais de saúde para muitos bebês / crianças pequenas e o laboratório não é tão confiável quanto deveria. As soluções de reidratação oral fornecem a quantidade certa de água e sais (sódio e potássio) para a maioria dos bebês e foram criadas para que um litro (ou um quarto, mais ou menos) da solução custasse centavos. No entanto, os fabricantes de fórmulas infantis, sempre buscando maneiras rápidas de ganhar dinheiro com bebês doentes, agora vendem soluções de reidratação oral (e soluções de manutenção, desnecessárias para o bebê amamentado) por muitos dólares o litro. Da última vez que olhei, 1 litro de solução eletrolítica oral custava US$ 12 (para uma mistura de água e sal! A margem de lucro deve ser enorme).
No passado, antes das empresas de fórmulas infantis entrarem no jogo, a diarreia, especialmente se associada a vômitos, era tratada com pequenas quantidades de líquidos administradas ao bebê com frequência. Refrigerante sem gás (eca) era uma recomendação frequente. Houve até orientações de alguns médicos para alternar entre Coca Cola (com alto teor de sódio) e outro refrigerante (com alto teor de potássio).
Na verdade, com a amamentação, o bebê recebe pequenas quantidades de leite frequentes. A mãe mantém o bebê ao seio, quase constantemente. Após grande ingesta inicial de leite materno no início da mamada (depois que o bebê acorda de uma soneca, por exemplo), o bebê mamará apenas pequenas quantidades de leite e a sucção na mama ajuda o estômago do bebê a esvaziar (reflexo gastrocólico), reduzindo assim o vômito. E se o bebê vomitar? A mãe deve colocá-lo de volta ao peito.
Ainda mais raro no bebê amamentado exclusivamente é a necessidade de reidratar o bebê com soro intravenoso.
Medicamentos para prevenir vômitos e diarreia
É importante constatar que a medicação para prevenir vômitos e diarreia quase nunca é necessária e geralmente não funciona de qualquer forma. E pode ser prejudicial. Mesmo que pareçam funcionar, não é uma boa ideia usá-los. O vômito e a diarreia são os métodos do corpo para livrar o intestino do vírus ou da bactéria, bem como das toxinas formadas por eles. Tratar o vômito e a diarreia com medicamentos pode, na verdade, prolongar a doença e fazer com que ela volte a ocorrer.
• Dimenidrinato é um anti-histamínico frequentemente usado por via oral ou como supositório retal para diminuir o vômito. Não há nenhuma evidência de que ele realmente funcione para tal efeito. Pode, entretanto, causar sonolência excessiva (letargia), que pode confundir o quadro clínico: O bebê está sonolento por causa da medicação ou porque está piorando? Essas medicações não devem ser usadas.
• Loperamida supostamente diminui a diarreia e também não deve ser usada, pelo motivo mencionado acima: a diarreia é a forma que o corpo encontra de se livrar dos germes e toxinas que causam a infecção do intestino.
• Os antibióticos são raramente necessários na gastroenterite comum, uma vez que a maioria delas é causada por vírus (norovírus, por exemplo) e não por bactérias. Mesmo se causados por bactérias, não é uma boa ideia usar antibióticos, exceto em algumas exceções.
O melhor “medicamento” para o vômito e a diarreia é a amamentação.
Diarreia prolongada
Na típica gastroenterite, o vômito não dura mais do que dois ou três dias e a diarreia raramente dura muito mais do que uma semana.
Se a diarreia durar mais de uma semana, pode ser porque os bebês estão comendo alimentos com baixo teor de gordura, típica e “tradicionalmente” a dieta “BRAT” amplamente recomendada na década de 1960 como uma dieta “suave” e maneira lenta de iniciar a alimentação após gastroenterite: banana, arroz, purê de maçã e torradas. Já falamos acima que se a criança com gastroenterite tem vontade de comer, ela deve continuar comendo normal, sem ser a comida pobre em gordura. Adicionar gordura à dieta da criança geralmente interrompe a diarreia “prolongada”. Observe que o leite materno contém muita gordura, especialmente se a mãe estiver amamentando há mais de um ano.
Várias empresas, incluindo fabricantes de fórmulas infantis, começaram a produzir produtos especiais para diarreia, especialmente “soluções de reidratação oral” com cenoura e arroz. Sério, cenoura e arroz? Pra que? Tudo isso, tendo baixo teor de gordura, prolonga a diarreia e, claro, rende muito dinheiro para os fabricantes, que ganham três vezes mais; uma com a fórmula que coloca a criança em maior risco de diarreia, a segunda com as fórmulas “especiais” para diarreia e a terceira com este lixo de cenoura e arroz.
As fezes de um bebê alimentado exclusivamente com leite materno podem parecer diarreia
As fezes de bebês amamentados exclusivamente com leite materno costumam ser mais moles, até líquidas. Além disso, costumam ser frequentes (7, 8 vezes ou até mais por dia não é raro), podem ser verdes e parecem não ter substância. Desde que o bebê esteja mamando bem no peito, esteja feliz e ganhando peso bem, não há problema. No entanto, se alguma dessas três condições não se aplicarem, algo pode estar errado. Observe que um bebê com fome que chupa os dedos pode parecer bem, então esse “sinal” pode não ser um bom sinal de que está tudo bem.
Uma das causas das evacuações esverdeadas frequentes, às vezes até com pequenas quantidades de sangue, é devido ao início tardio da diminuição da produção de leite. A maneira de lidar com isso é aumentar a ingestão de leite materno pelo bebê.
Regurgitações
Regurgitar é diferente de vomitar, pois o vômito costuma ser forte e ocorre fora do padrão normal de comportamento do bebê, ou seja, o bebê não está “normal”. Já na regurgitação, o leite sobe quase sem ninguém perceber. Nem o bebê, nem os pais, até que o pai que está segurando o bebê no colo sinta seu ombro molhado.
Se o bebê está mamando bem, ganhando peso bem e é um bebê feliz, mesmo regurgitando bastante, não há problema. Na verdade, é até bom. O leite materno está cheio de fatores imunológicos (não apenas anticorpos, mas outras dezenas que interagem uns com os outros) que protegem o bebê da invasão de bactérias e vírus, revestindo as membranas mucosas (intestino, trato respiratório e outros locais). Esse revestimento, essa barreira, evita que os germes entrem no corpo e no sangue do bebê. O bebê que regurgita tem dupla proteção, formando essa barreira quando o bebê mama e o leite vai para o estômago e depois quando ele volta. Isso é particularmente importante, pois é a parte superior do intestino e do trato respiratório que está mais exposta a bactérias e vírus. Costumo usar este exemplo para mostrar como a amamentação é diferente da fórmula e da mamadeira. Regurgitar a fórmula, se tudo mais estiver indo bem, provavelmente não é ruim. Regurgitar leite materno, se tudo estiver indo bem, provavelmente é bom. Ótimo, porque os fatores imunológicos que cobrem o revestimento do esôfago são reabastecidos com regurgitações.
If you need help with breastfeeding, make an appointment at our clinic.
Se você precisa de ajuda com a amamentação, marque uma consulta em nossa clínica.
Copyright for the Portuguese version: Jack Newman MD, FRCPC 2020
Copyright for the original English version: Jack Newman, MD, FRCPC, Andrea Polokova, 2017, 2018, 2019, 2020
Translation: Dra Maria Luisa Silva Quintino (Brazil)